E.MAIL-POEMA DE CLAUDIO BENTO PARA LUCIA WELT
Estes textos foram publicados primeiramente no blog Vida e Obra de Alma Welt, daí o prólogo abaixo:
"Como sempre, pedindo permissão para a Alma, a venerada poetisa minha irmã, publico aqui no seu blog, mais um poema do grande poeta mineiro do vale encantado do Jequitinhonha, dedicado a mim, Lucia, a quem muito honrou elegendo-me sua Musa. Honra maior não há para uma mulher. Sei que a Alma perdoará a minha vaidade, tanto mais que o poeta é bom, verdadeiro e sua poesia brota da alma e do coração, fazendo-o intérprete dos mais legítimos de sua região de nascimento e infância, que ele evoca com simplicidade e emoção, além de sugestiva e sintética capacidade de descrição" (Lucia Welt)
O e.mail:
Lu, na minha infância as lavadeiras que batiam e lavavam roupas na beira do rio era um encantamento. As pedras eram decoradas com roupas de várias cores.
As pedras eram mosaico de cores.
Enquanto minha avó lavava a roupa
ficava eu sentado numa pedra ou numa canoa.
Comíamos ali mesmo, de capitão,
depois bebíamos água do rio, mordíamos rapadura de cana caiana.
Bonito era quando elas cantavam,
até então não sabia de onde elas tiravam aquelas coisas, aquelas músicas,
lindas, lindas de dá dó de tão lindas.
Ainda tinham os canoeiros em sua estrada de àgua, em seu caminho de sonhos.
Os pescadores vinham com cambões de peixes.
Meninos na praia com enfieiras de jenipapo.
Minha aldeia era linda quando amanhecia.
As noites eram tecidas com estrelas, luares, luz lunar sobre as águas do rio.
A cancela batendo.
O boi.
A cobra coral.
O bode.
Buchada de bode no jantar. Madressilvas. Erva-cidreira no quintal.
O quintal era o circo das ilusões, o picadeiro-mor da minha vida.
As lavadeiras cantavam.
O capitão de tambor ordenava o batuque,
a folia de viola caipira,
a dança, a catira, o amor.
As brincadeiras ainda eram de roda, o cravo brigou com a rosa,
este ano não vai ser igual aquele passou.
Os carnavais coincidiam com os dias quentes de verão,
no São João assávamos batata doce na fogueira, na semana santa era sagrado o cuscuz de milho, a canjica, a posta de peixe bem posta na mesa.
A procissão do senhor morto era a mais triste, a do encontro também.
Em setembro havia festa para os santos ibêjes,
festão com caruru, vatapá, acarajé, mungunzá, xinxim de galinha,
transe no terreiro de Ogum, no reino dos tambores, mão de preto no couro.
As lavadeiras cantavam alegres, batendo roupas, quarando a vida debaixo daquele sol.
Meu amoroso coração ficou morando
no meio do canto daquelas mulheres, no meio das àguas daquele rio.
Lu, um grande beijo nos lábios cor de amora da minha ilusão.( Claudio Bento)
Postado por Lúcia Welt às 14:36 1 comentários Links para esta postagem
e.mail-poema de Claudio Bento para Lucia Welt
(APÓS A MINHA RESPOSTA, O POETA ACABA DE ENVIAR-ME NOVO E.MAIL-POEMA):
Lu, minha deusa e musa, o poema fará parte do livrinho dedicado a ti. Ainda este ano enviarei esboço do livro, uma simples reunião de uns vinte e poucos poemas toda dedicada a ti. A primeira parte terá o título de A Mão De Eros, a segunda, Memórias Do vale Encantado. Quem sabe o Guilherme pintasse uma capinha, seria sensacional.
Leu matéria sobre As Lavadeiras do Vale Encantado ? Quero comentários. E gostaria muito que você conhecesse o nosso Festivale, faça uma viagem louca ao sertão de Minas gerais, assim como Alma no sertão de Pernambuco no seu pavão mysterioso. Venha conhecer o que há de mais belo e simples neste mundo.
Verás o rio sinuoso que corta montanhas e pedras. Verás o artesanato em barro exposto na beira da estrada, verás a feira de Araçuaí, o mercado de Diamantina, as igrejas do Sêrro, as praias, as ilhas, as pedras negras de Itaporé. Areia branca de Itinga.
Vem Lúcia Welt, segura a minhã mão e vem, verás que o mundo é injusto ante a pobreza que grassa no vale mais miserável do mundo, com seus índices de pobreza comparado ao da àfrica. Ainda assim te comoverás com o desprendimento do povo do vale, sua generosidade, sua hospitalidade, sua simplicidade, sua beleza. Onde a gente não tem para comer mas de fome não morre porque no vale tem senhor São Miguel, Nossa Senhora De Santana, tem canto de Ossanha.
Segura a minha mão e vem, serei teu cicerone pelas ruas do vale encantado, dançaremos catira, quadrilha, baião. Dançarás ao som da sanfoninha pé de bode num forró pé de serra, à luz de lampião.
Sairás daqui convicta de que este mundo está errado e que o povo do vale merece um maior respeito. Ficarás embevecida com a humildade desta gente.
Vem e verás a banda De Taquara de Minas novas, o Trança Fitas de Turmalina, o boi de janeiro de Rubim, a marujada do Sêrro, a festa do rosário de Araçuaí, o carnaval de Jequitinhonha, a cachaça de salinas.
Verás as famosas bonecas de barro de Dona Isabel, as máscaras de barro de Maria Lira, os tambores de Mestre Antônio, a poesia que neste vale é como a poeira vermelha que cobre o céu.
Verás o rio e suas canoas, canoeiros cantando beira-mar, verás a travessia de balsas e pequenos barcos na fímbria das águas ribeiras. E te emocionarás com tanta beleza.
E ainda comerás farofa de feijão andu temperada com urucum, salsa, cebola, tempero verde e muito alho e muito torresmo.
Comerás frango caipira com quiabo e angu, tutu de feijão com torresmo e rodelas de ovos de codorna. Comerás carne de sol com mandioca, leitão a pururuca, linguiça de porco. Ainda no vale encantado comerás sarapatel, pirão de peixe, moqueca de camarão, peixe frito no azeite de dendê. Tomarás cachaça com ervas aromáticas, com imburana, com papai nicolau, com erva-doce. Tomarás ainda refrescos de pitanga, de jenipapo, de biribiri, de cacau, de carambola, manga e graviola.
Andarás pelas praias do rio, banharás em suas cachoeiras. Pisarás as pedras das cidades históricas do vale. Andarás com Chica da Silva, verás Juscelino dançar sua valsa em pleno coreto de Diamantina. Verás a vesperata, ouvirás o peixe vivo,
dançarás ao som da folia de santos reis, ao som de violas e tambores que enternecerão sua alma, seu coração ficará comovido e então chorarás de tristeza e também de alegria, muita alegria.
Andarás de canoa com o vento lambendo seus cabelos, da praia os coqueiros, as palmeiras e os jenipapeiros acenarão à sua chegada e eu serei teu guia em cada palmo de chão, em cada vereda de caminho.
Verás as estrelas do céu do vale encantado, o luar atirando sua luz sobre as águas do rio desenhando uma paisagem dourada diante de seus olhos.
Vem, serei teu cicerone, teu poeta, teu amante.
Vem, o vale encantado te espera. (Claudio Bento)
Há 6 anos
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