sexta-feira, 3 de julho de 2009

Sobre o fenômeno da repercussão mundial da morte de Michael Jackson (por Lucia Welt)

Diante das proporções inimagináveis da repercussão da morte do cantor e dançarino “pop” Michael Jackson, arrisco a seguinte análise do fenômeno, começando com uma indagação:
Por quê o impacto emocional e a repercussão na mídia está sendo tão grande, tão desproporcional à própria qualidade do músico, compositor, cantor e dançarino, que ele era? Sim, pois que o Michael era um mero fruto específico de uma vertente da cultura popular norte americana, a meu ver altamente discutível e nem de longe uma arte de primeira classe. Um menino negro sofrido, sem dúvida, que por isso mesmo não queria crescer e que nunca aceitou ou assumiu a sua raça a ponto de querer ser branco e fazer um esforço imenso e patético, doloroso, para se tornar branco, de lábios e nariz finos e cabelo liso. Mas porque sendo um fruto de negação da realidade e portanto não de rebeldia legítima mas de doloroso conformismo, ele mobilizou e mobiliza tantos ainda, após a sua morte? Eu diria que por essa mesma recusa em crescer. Metade da humanidade se identifica com essa recusa, que décadas atrás ganhou o nome de “Síndrome de Peter Pan”. Diante dos horrores da nossa época, fruto da maldade, perversão e brutalidade do chamado “homem adulto e responsável”, devastador da natureza, criador de guerras, concentrador de riquezas e disseminador de miséria, uma imensa legião de homens e mulheres se identifica com esse sonho de permanecer criança, na suposta pureza e inocência desses pequenos seres que fomos, e em que Freud já havia, no entanto, detectado o embrião da violência e da crueldade negadas por nós em nossa mitificação dessa mesma infância.
Essa é, a meu ver, a verdadeira causa do fenômeno universal da repercussão da morte desse ídolo de pés de barro, que sintomática e simbolicamente queria andar para trás, a ponto de fazê-lo estilisticamente em sua dança.
A mídia internacional corrobora esse mito aumentando ou induzindo mesmo proporções universais, já que estamos na era da globalização e conseqüentemente também da banalização. Mas os meios de comunicação, como intermediários que são do inconsciente coletivo não logram auto-analisar-se e nem detectar a causa e a fonte dessa necessidade desesperada das pessoas de se identificarem, a ponto de sacralizarem um menino martirizado, um jovem doente e homem de 50 anos visivelmente deteriorado e trágico em sua recusa do amadurecimento e que cuja revolta se manifestava de maneira equivocada, com a afirmação de ser “bad” (mau), pertencer a gangs de meninos delinqüentes em recintos visivelmente subterrâneos, cantando e dançando com agressividade marginal, com ríctus de ódio no rosto e gestos sincopados, espasmódicos e agudos. Tudo o que afinal corrobora a era de ódios e preconceitos em que estamos mergulhados.
Triste mundo o que faz de um menino magoado o seu herói!...
(Lucia Welt)

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