terça-feira, 2 de outubro de 2007

Carta de Lucia Welt ao Rógério Silvério de Farias, o Poeta das Sombras do Sul

Eu, Lucia, transcrevo aqui, docemente constrangida (não mereço), as generosas palavras do meu amigo e conterrâneo, Rogério Silvério de Farias, no seu interessantísmo e divertido Blog, entitulado O POETA DAS SOMBRAS DO SUL, e a seguir o e.mail que enviei a ele, motivando este comentário e a publicação de minha carta no seu blog:

(Comentário do Roger):

"Lúcia Welt, sempre genial como sua irmã, a imortal Alma. Estou chorando de saudades da Alma, estou chorando de outra coisa que ontem magoou meu coração solitário e sonhador. Contarei em breve, em detalhes, em forma de conto, o que me aconteceu ontem. Estou triste e arrasado, mas não morto. Ai, Alma por que morreste? Quanta solidão quando se é grande! Eis o texto genial de Lúcia, ao poeta das sombras do Sul, em forma de missiva eletrônica (presumo que Lúcia será a sucessora, em talento poético, de sua irmã saudosa)":

(A minha carta):



Ó confrade Rogério (da Confraria dos Poetas Banidos), minha irmã também amava aquele site, mas quem sofreu duplamente com isso foi o Guilherme de Faria, que além de tê-la como sua "descoberta" e última e definitiva musa, foi cassado juntamente com a Alma pois cismaram que minha irmã (pasme!) era (ou é) um heterônimo seu. Às vezes me pergunto se Alma sofreria com isso se tivesse acontecido com ela em vida, pois ela era surpreendente e tinha um enorme senso de humor. É dela aquela expressão " interconfetismo", que ouvi de sua boca a respeito daquele site. Mas a julgar pelo número enorme de trabalhos que ela publicou ali ( 513) ela devia ter algum amor ou apego ao RL, que lhe permitiu ficar conhecida nacionalmente e até em Portugal (mais de 14.000 leituras em 10 meses, 2000 delas só na semana de escândalo que se seguiu à sua morte). Mas a verdade é que os editores daquele site foram fracos pois sucumbiram à pressão dos invejosos e hipócritas que forçaram a sua expulsão como se morrer fosse um crime, e não uma tragédia. Se ela fosse um heterônimo, seria igualmente revoltante e desprezivel a atitude deles, pois então um autor não tem o direito de matar o seu personagem? Bem... sabemos que todas às vezes que isso aconteceu na história da literatura os autores assassinos foram apedrejados pelos leitores revoltados. Basta lembrar o caso do Conan Doyle que recebeu milhares de cartas de dasaforos quando o seu célebre Sherlock Holmes morreu nas cataratas lutando com o seu arqui-inimigo o doutor Moriarty. O autor arrependido (ou acovardado, não sei) achou melhor ressucitá-lo, fazendo-o ter sobrevivido surprendentemente e reaparecendo para a alegria do doutor Watson e dos leitores fiéis . Ah! Quizera num mundo mágico poder fazer isso com a Alma. mas parece que a realidade pode ser pior do que pensávamos, pois corre agora aqui na região a suspeita levantada por um delegado de que Alma não se matou, mais foi assassinada, depois de violada! Não, não quero acreditar nisso. Ai! Roger, a dor não terá fim...

Mas... quanto ao Recanto não lamente, querido Roger( se é que o faz) por ter sido expulso, pois é uma glória, como já comentamos, pois os grandes não se adaptam a panelinhas e muito menos a cabresto. E se a expulsão for acompanhada de escândalo, tanto melhor, pois é sinal de sucesso. Os chamados "succès d'escandale" dos franceses, sempre foram provocados por obras de valor duradouro, pois revolucionárias e chocantes, estavam à frente da sua época, como bem o disseste a respeito da Alma.

A verdade é que os grandes autores são solitários e não são bem vistos dentro de confrarias, pois logo despertam a inveja, a incompreensão ou o despeito dos confrades. E na pior das hipóteses os artistas seriam pavões de belas caudas que as abrem para impressionar as fêmeas, e juntados num cercado vão certamente se bicar. Ah! A natureza humana dos pavões...

Roger querido, tenho freqüentado teu site e o acho divertidíssimo e interessante. Percebo também a tua angústia, que o faz ser tão inquieto, como a Alma o era, tornando-a muito visível e visada em sua nudez física e espiritual que acabou incitando a agressão dos fracos, feios ou despeitados. E dos lobos em pele de cordeiro...

No caso da Alma há também um outro fator: ela era adorável, superior, meiga e... dadivosa. Dava seu talento mas também sua beleza e seu corpo generoso e excitante. Sua liberdade e candura fizeram-na afinal uma espécie de Geni (do Chico Buarque), a quem aqueles que desfrutaram de suas dádivas, ao vê-la entregar-se ao inimigo comum ( no caso dela a própria Morte) para salvá-los ou redimi-los, resolveram apedrejar e "jogar bosta".

Querido, espero mais visitas suas lá nos blogs dela, pois não paro de publicar todos os dias um soneto novo. Descobri que minha irmã deve ter escrito mesmo uns mil sonetos ( e não 700 como eu pensava) pois a arca que descobri dela no nosso sótão é uma cornucópia de surpresas. Acabo de publicar um soneto desconhecido dela entitulado "A plenitude da Alma", que pela data deve pertencer à série pampiana, e contém mais uma chave para entender o seu espírito, e a mensagem de sua obra, que descubro monumental ao mesmo tempo que intimista (contradição em termos).

Quanto à tua saudade da grande Alma, tu me comoveste, mas veja, seu espirito está vivo entre nós na sua obra imortal. Não é para isso que serve a Arte, para sobreviver à morte? Mas reconheço: lendo-a todos os dias para publicá-la, eu a sinto tão viva, Roger, que morro de saudades de tocá-la, olhar a sua beleza e seu olhar. E de abraçar, sentir o calor, e beijar a mais bela e doce criatura que passou por este mundo e me deu a honra de nascer sua irmã.

Fica com um beijo meu pelo menos, ó poeta solitário das sombras do sul.

Um abraço pampiano da Alma
através desta pequenina Lucia

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